segunda-feira, 15 de março de 2010


TEMOR E TREMOR

Há situações na vida em que o temor não depende de tremor para existir. Há, também, ocasiões em que o tremor desperta temor. Há, ainda, aqueles que dizem vivenciar temor e tremor ao mesmo tempo. Num período em que tomamos conhecimento de terremotos no Haiti, Chile e China, não podemos nos esquivar das palavras “temor” e “tremor”.

Geralmente, associa-se “temor” a “medo” ou “terror”. Entretanto, “temor” não deve ser tratado somente nessa perspectiva. “Temor” também significa “respeito”, “reverência” e “piedade”. No que tange à palavra “tremor”, observa-se que a mesma pode também referir-se a “medo”. Mas, como é sabido da maioria, “tremor” traduz, especialmente, “tremor de terra”, “estar trêmulo”, “tremer” ou “estremecer”.

O temor não depende necessariamente de tremor, pois há muitas pessoas vítimas da síndrome do pânico morando em lugares aonde não há abalos sísmicos. Além disso, há também pessoas que, em razão de sua consciência moral ou religiosa, com ou sem terremotos, mantém uma postura de reverência notória.

Observa-se que “temor” surge depois de “tremor” quando uma pessoa se vê impotente diante de forças superiores a ela, forças que ela não tem possibilidade alguma de controlar por si mesma. Segundo a história das religiões é nesse contexto que o homem cria deuses para si. Possivelmente, tal “temor” seja “pai do politeísmo”.

Por sua vez, “tremor” pode despertar “temor” na medida em que uma experiência provoque em uma pessoa o exame de si mesma, exame esse que a faz assumir uma nova postura diante da vida e daquilo que ela considera sagrado. Tal experiência é magnífica quando gera um estilo de vida sóbrio e solidário e é desastrosa quando promove fanatismo e enclausuramento.

Finalmente, é possível vivenciar “temor” e “tremor” ao mesmo tempo. Tal testemunho pode ser encontrado na Bíblia. Segundo seus relatos, o Deus nela revelado é Pai, Juiz e Intercessor, alguém que prioriza acolhimento a banimento e, em razão do Seu amor, abençoa e disciplina seus filhos e filhas que diante d’Ele temem e tremem.


Uéslei Fatareli, rev.
Mestre em Ciências da Religião
pela Universidade Presbiteriana Mackenzie
"EM NOME DE DEUS"

O que desvia os ouvidos de ouvir a lei,
até a sua oração será abominável.
Pv 28:9

Tem gente que pensa que orar é “não fazer nada”. Para tais pessoas a oração não tem importância e é uma pura perda de tempo. Por mais estranho que possa soar aos nossos ouvidos, muitos que seguem esse raciocínio em nossos dias não são necessariamente ateus, mas religiosos à toa que se renderam uma espiritualidade meramente nominal e institucional. Nesse sentido, encontramos com certa facilidade muita gente que não têm qualquer dificuldade em afirmar seu assentimento intelectual com relação ao cristianismo, mas que, por outro lado, desconsidera e despreza o fato de Cristo ser, por meio da oração, o maior exemplo de uma relação viva com o Pai nosso que os Evangelhos narram.

Há também quem veja a oração somente como uma muleta ou como um remédio. Estas pessoas entendem que Deus existe para ser usado e consumido somente nas horas difíceis e não para ser amado em todo o tempo. Desta forma, a oração acaba sendo reduzida a um tratamento meramente utilitário no qual o que importa é receber benefícios com o fim exclusivo de esbanjamento individual e egocêntrico. Um comportamento assim aborta toda e qualquer perspectiva relacional com Deus e faz da oração um monólogo ao invés de um diálogo. Geralmente quem tem este tipo de relação com Deus se esquece que orar é aquietar-se em Sua presença e, humildemente, se prostrar em silêncio diante do Espírito que guiou Jesus no deserto, Espírito que nos guia a toda verdade.

Outros, entretanto, vêem a oração como um modo eficaz de se manter uma relação de profunda amizade com o Criador do Universo, relação que não transforma o Pai nosso, mas que transforma aquele que ora ao Pai nosso e com o Pai nosso. Quem vive assim acaba por participar de Suas obras no mundo e testemunha uma fé que jamais fecha os olhos para o mundo ao seu redor, mas trabalha para transformá-lo com uma vida transformada. Neste caso, ao contrário do que pensava Marx, é a comunhão com Deus, fundamentada em Sua Palavra libertadora e santificadora, que coopera no sentido de libertar o povo de seus ópios e de tudo que o entorpece.

Embora haja muitos tipos de enfoque que poderiam aqui ser mencionados, tanto no aspecto positivo como negativo acerca da maneira que a oração é vista ou tratada, mencionamos nesta parte derradeira de nosso breve artigo, uma oração que Deus, segundo o livro de Provérbios, abomina.

Para mencioná-la, destacamos algo ocorrido meses atrás em Brasília e que foi transmitido pelos meios de comunicação. Referimo-nos às lamentáveis cenas de pessoas ligadas ao campo político que oravam, ao mesmo tempo em que arquitetavam ações corruptas. Tal episódio nos aproxima das palavras de sabedoria quando elas dizem que alguns oram a Deus, mas não dão ouvidos à Sua Lei. Tal oração e conduta Deus abomina, pois transmite a idéia de que Ele é um ser indiferente à justiça, a moral e a ética, o que Ele não é.

Finalmente, sem qualquer pretensão de colocar ponto final ao assunto, até porque somos alunos da escola da oração e continuaremos a ser ao longo de toda a vida, aprendemos com os desdobramentos da oração abominável, que quem semeia corrupção é desmascarado e colhe condenação, principalmente quando semeia em Nome de Quem não se associa com a iniqüidade e nem admite que Seu Nome seja usado em vão. Ao Deus justo que quer que mantenhamos companhia com Ele por meio da oração, mas que também nos ensina que não atende a todo e qualquer tipo de oração a Ele dirigida, toda a honra e glória, hoje e sempre!
Uéslei Fatareli, rev.
BEM-AVENTURADOS
OS QUE CHORAM

De quando em quando, no campo da religião, surge algum fato associado a estátuas que verteram ou teriam vertido lágrimas. Como é de costume, o assunto desperta o interesse da mídia e, por conseguinte, da população que amplia o assunto sob os mais diversos ângulos e percepções.

Com certeza, algumas pessoas, não necessariamente céticas ou descrentes, rejeitariam acreditar em tal possibilidade e associariam o assunto a algum tipo de crendice popular ou, até mesmo, de fenomenologia arranjada. Outras, ao contrário, não colocariam dúvidas sob o suposto acontecimento e o tratariam como algo digno de reverência.

Deixando de lado os posicionamentos e as polarizações que emanam do episódio em si, surge para nós, a partir dele, uma dupla pergunta: Será que somos uma geração que desaprendeu a chorar e que ainda não entendeu o sentido da bem-aventurança que diz: “bem-aventurados os que choram, porque serão consolados”?

Se examinarmos a nós mesmos e a geração atual com franqueza, veremos que o amor tem se esfriado de muitos, apesar do aquecimento global. E por que dizemos isso? Por constatarmos um número cada vez maior de pessoas dispostas a ocultar, negar e, até mesmo, a querer por fim em todo tipo sofrimento, imaginando ser possível viver neste mundo, marcado pelo imprevisível, sem incômodos. Evidentemente, não estamos aqui propondo, sob hipótese alguma, um modo de viver masoquista, mas, simplesmente, olhando para a vida sem máscaras ou fantasias.

Por fim, precisamos nos desvencilhar dos sentimentos ilusórios e lembrar sempre que todo aquele que rejeita o amor que tudo sofre, demonstra não estar disposto a chorar com ninguém e por ninguém, a não ser que tenha consigo o espírito das carpideiras. Se isso acontecer nos tornaremos uma geração petrificada, sem lágrimas, que se volta para as estátuas e imagens querendo ver nelas o que não vê mais em si mesma.

Uéslei Fatareli, rev.
Mestre em Ciências da Religião
pela Universidade Presbiteriana Mackenzie