quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

PECADO & CAPITAL



Antes da inauguração de Brasília em 1960, meu pai, motorista profissional, transportou várias vezes, em razão da empresa que prestava serviços, gêneros alimentícios para os trabalhadores que, em sua maior parte, estavam ligados à construção civil. Tais pessoas, com grande esforço e labuta, enfrentaram não só as dificuldades próprias de uma região inóspita, como também a falta do aconchego familiar em razão da distância de seus lares. Sem trabalhadores com tal disposição, não seria possível dar forma concreta aos desenhos arquitetônicos de Oscar Neimeyer e Lúcio Costa. Aliás, em meu modo de ver, foi por meio desse movimento conjunto, ordenado e equilibrado de trabalhadores inteligentes, para alguns, fruto de uma criação que surgiu por acaso, para outros, fruto do Criador de tudo que é sagrado, que nasceu Brasília.
Recentemente, os meios de comunicação de massa transmitiram gravações que permitiram aproximarmo-nos da conduta de autoridades ligadas ao governo do Distrito Federal e de pessoas associadas às mesmas. Tais imagens, ainda que para o nosso excelentíssimo presidente da República “não falem por si mesmas”, expressam pelos menos duas coisas. A primeira é que a política brasileira ainda é comandada, em muitos setores, por uma mentalidade de compra e venda. Tal modus operandi se pauta por uma voracidade sanguessuga que vive dominada pela obsessão de ter sob seu controle permanente o poder político e econômico, almejando assim, por meio deles o enriquecimento próprio de maneira ilícita e, junto dele, o acúmulo de vantagens que garantam a posse definitiva de tudo que vêem pela frente, ainda que com tal alvedrio gastronômico morram pela boca. O segundo aspecto ligado às imagens supramencionadas é aquele que se refere a um tipo de postura comunicativa que usa as palavras, discursos, métodos, lacunas do direito, tribunas e até mesmo orações para defender uma prática enganadora que acaba por manifestar um modus faciendi semelhante ao pai da mentira que distorce a verdade, banaliza a ética e zomba dos bons costumes,

Caríssimos leitores, mesmo que o país e a capital brasileira sofram com tanta corrupção e falta de ética, ainda temos a oportunidade de mudar, não mudar do país, mas de sermos instrumentos para que mudanças ocorram no país. Para isso, precisamos ser mudados, transformados de dentro para fora, não por uma força solitária e centralizada em nós mesmos e nem por qualquer tipo de ideologia inventada pelo homem que pensa ser deus, mas a partir de uma relação viva e humilde com Jesus Cristo, o Deus que se fez gente e que assumiu a forma de servo. Somente por meio d’Ele e caminhando junto d’Ele com fé e obediência aos Seus ensinamentos aprenderemos a viver o amor que jamais acaba, o amor que tudo sofre, o amor que tudo crê, o amor que tudo suporta, o amor responsável, terno, firme, solidário, exigente consigo mesmo e compreensivo com todos mas que não nos obriga a sorrir para todos.

Finalmente, melhor do que vencer nos grandes torneios esportivos que se aproximam é obter vitória sobre nossos atuais adversários, e os piores são aqueles que se disfarçam de brasileiros, mas que na prática são antibrasileiros. Nesse sentido, se nos deixarmos guiar pelo modus vivendi de Jesus Cristo que, motivado pelo amor sacrificial, praticava a justiça, construía pontes ao invés de muros, moldava vidas sem manipulá-las, curava sem pedir nada em troca, confrontava e corrigia sem perder a ternura, aproximava-se de todos e permitia que todos d’Ele se aproximassem, reconhecia o pecado e o pecador mas não se conformava com o pecado e nem entrava em acordo com quem preferia o pecado ao arrependimento, seremos então mais do que vencedores. Por isso, enquanto há tempo, que o arrependimento e a conversão ao Senhor Jesus ocorram e sejam vistos em nossas vidas, pois se isso não acontecer o que restará das cidades serão ruínas que servirão de sepulcro para obras de arte feitas por trabalhadores em movimentos sagrados.

Soli Deo gloria.

Uéslei Fatareli, rev. ms.

O DEUS QUE SOFRE CONOSCO


Quem já não ouviu ou mesmo não fez a seguinte pergunta: “Se Deus existe, porque então ele não põe fim a tanta injustiça e a tanto sofrimento que há na terra e entre os seres que nela vivem?”. Se pararmos e pensarmos nessa pergunta, observaremos que a mesma tem sua razão de ser, proceda ela da boca de alguém que se diz ateu, deísta ou livre pensador. Essa indagação ocorre porque somos pessoas que querem encontrar razão na vida, queremos saber o sentido para o qual ela existe, queremos compreender o quê ou quem deu a ela origem, queremos entender a causa de uma dor, queremos decifrar o porquê do sofrimento pessoal ou alheio e muitas outras coisas. E, no que se refere à vida, incomoda-nos o fato de que a dor ou o sofrimento, de uma forma ou de outra, voluntária ou involuntariamente, nela esteja presente. E além do desconforto que a própria dor já causa por si mesma, incomoda-nos mais ainda o fato de não termos alguém que nos ajude a tratar dela e com ela. Também nos deixa bastante desconfortáveis a terrível expectativa de não poder amenizá-la ou superá-la.

Caríssimos leitores, tomando como base de análise as “imagens”, ou melhor, as “caricaturas” de Deus na Pessoa de Jesus de Nazaré que nos tem sido atualmente apresentadas, é possível observar que a pergunta, lançada no início de nossa breve reflexão, além se agigantar ainda mais, acaba por ecoar com maior intensidade nos ouvidos e na alma de quem sofre, pois em grande parte das pregações (nem sempre fiéis ao contexto bíblico geral ou particular; ou, em alguns casos, especulações acerca de “Deus”), focaliza-se Jesus numa única perspectiva; ou seja, àquela que o limita a alguém que vem ao mundo somente para por fim de forma definitiva à dor e ao sofrimento enquanto vivemos aqui, esquecendo-se que foi o próprio Jesus que disse: “Neste mundo experimentareis a aflição, mas tende confiança. Eu venci o mundo!” (Jo 16.33).

Desta forma, quando isso acontece, quando somos apresentados a um “Deus” que somente serve para solucionar (e rápido) o problema da dor no tempo em que aqui vivemos, acabamos sendo levados a conceber a ideia de um “deus anestésico”, que existe para nos impedir de experimentar qualquer tipo de sofrimento. Nesse sentido, a cruz de Cristo, de símbolo do amor sacrificial, torna-se mero objeto estético de um mundo que se rende às superstições, aos modismos e à magia.

Antes de continuar precisamos deixar claro que não estamos aqui fazendo qualquer tipo de apologia cega ou fatalista ao sofrimento e muito menos querendo que as pessoas tenham a visão de um “deus masoquista”. Todavia, queremos que todos saibam que, segundo as Escrituras Sagradas, o Deus Todo Poderoso não é somente alguém que possui o poder de criar os céus e a terra, como também não é alguém que vive exclusivamente para operar milagres. Ele é, também, alguém que compreende a nossa dor e que sofre conosco, pois foi à cruz em nosso lugar e é ele que diz a todos nós: “Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, dia a dia tome a sua cruz e siga-me”(Lc 9.23).

Finalmente, se aprendermos de Jesus e com Jesus a partir da Palavra de Deus, manifestaremos, por obra do seu poder, um duplo tipo de reação diante do sofrimento; ou seja, aquele que faz com que enfrentemos a nossa dor não com murmuração, mas com a confiança de que os sofrimentos do tempo presente não podem ser comparados com a glória a ser revelada em nós (Rm 8.18), e que, também, nos dispõem e nos movem a sofrer com os que sofrem com compaixão. Por isso, a pergunta que precisamos fazer não é primordialmente a que já cogitamos na introdução do texto, mas é outra: “Se o Deus Todo Poderoso que a Bíblia revela sofre com e pelos que sofrem, qual a razão em não compreender que na escola da vida coroa de espinhos antecede a coroa de glória e que sangue, suor e lágrimas antecedem a vitória?”. E ainda: “Por que somos tardios em aprender que disciplina antecede o aperfeiçoamento, ‘que a tribulação produz perseverança; e a perseverança, experiência; e a experiência, esperança’ (Rm 5.3,4) ?”.


• Uéslei Fatareli é mestre em ciências da religião pela Universidade Mackenzie, compositor e pastor.